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Alergia Alimentar na Criança

 

Dr António Jorge Cabral

Pediatra (OM) e Alergologista Pediátrico (EAACI)

Hospital Central do Funchal

Unidade de Alergologia Pediátrica - Unidade Local de Saúde de Santa Maria

A alergia alimentar consiste numa resposta exagerada à ingestão, contacto ou inalação de um alimento. Esta reacção surge porque o corpo identifica o alimento como algo prejudicial, podendo surgir mesmo com quantidades mínimas. A substância causadora de alergia denomina-se alergénio.

Apesar de mais frequente em crianças, a alergia alimentar pode desenvolver-se em qualquer altura da vida. Na Europa, estima-se que 6-8% das crianças apresentem alergia alimentar, com implicações na saúde pelo risco de reacções graves e défices nutricionais; sociais por dificuldade de integração e dietas de evicção; e psicológicas por isolamento social e bullying. Os alimentos mais frequentemente envolvidos são o leite de vaca e o ovo, seguidos dos cereais, peixe e frutos secos.

Após o contacto com um alergénio, o corpo pode manifestar-se de várias formas. Podem surgir reacções gastrointestinais como vómitos, diarreia e dor abdominal; manifestações cutâneas incluindo urticária e angioedema (inchar dos lábios ou pálpebras); envolvimento respiratório com dispneia (falta de ar), tosse, pieira e congestão nasal; circulatório com hipotensão e síncope (desmaio). Estas manifestações podem ser ligeiras, resolvendo espontaneamente, a graves, como a anafilaxia. Esta trata-se de uma reacção sistémica de evolução rápida, normalmente caracterizada por hipotensão, dispneia e angioedema, podendo ser fatal. Exige uma intervenção urgente, motivo pelo qual é frequentemente prescrito uma caneta de auto-administração de adrenalina. Apesar de fáceis de utilizar, é necessário o treino dos pais, dos cuidadores, da escola e das próprias crianças no seu manuseio.

É frequente confundir intolerância alimentar com alergia. Numa intolerância, o corpo tem dificuldade em processar um certo alimento. Um exemplo comum é a intolerância à lactose que surge por défice da enzima lactase. A sua acumulação causa flatulência, dor abdominal e diarreia. O diagnóstico é feito através de um teste específico, e o tratamento consiste na evicção da lactose. Os leites sem lactose, apenas não contêm este açúcar, sendo semelhantes nos restantes constituintes. Não são apropriados aos alérgicos ao leite de vaca.

A investigação deve ser realizada cedo, visto que uma alergia alimentar não confirmada pode originar evicção alimentar desnecessária com consequências importantes. Além da história clínica, essencial para o reconhecimento do alimento suspeito, o diagnóstico assenta em testes cutâneos, análises sanguíneas e na prova de provocação oral. Os dois primeiros permitem verificar a sensibilização ao alergénio. Porém, para a confirmação, pode ser necessária a realização da prova de provocação. Esta só deve ser realizada sob vigilância médica e por profissionais treinados.

A alergia alimentar, todavia, será sempre um desafio para uma família. Para além do risco nutricional inerente, os estudos afirmam que há pior qualidade de vida para doentes que apresentam um maior número de alergias alimentares, assim como a presença simultânea de outras doenças alérgicas, como a asma, rinite, dermatite atópica. O impacto da alergia alimentar vai além da restrição alimentar, influenciando eventos sociais familiares, festas, socialização com amigos e até casos de bullying, originando exclusão, depressão, stress, ansiedade. É fundamental incluir a criança alérgica em todas as atividades dos seus pares, informando e sensibilizando todos os envolventes. Por exemplo, em caso de festa de aniversário, garantir que há um bolo livre de alergenos para a criança alérgica.

Para manter uma dieta isenta do alergénio, é essencial a leitura cuidadosa dos rótulos dos produtos, incluindo produtos de aplicação cutânea, como cremes. Para a preparação das refeições, além de dar preferência a ingredientes não processados, devem-se utilizar utensílios bem lavados para evitar risco de contaminação (Exemplo: uma faca usada para cortar queijo não pode ser usada na confecção de alimentos de um alérgico ao leite de vaca). Felizmente, a tolerância aos alimentos mais comuns, é alcançada em 68-80% até aos 16 anos.

Estas restrições originam situações de isolamento. Em certos contextos, tais como na escola ou em festas de anos e de família, a sensação de exclusão é redobrada. Deve-se minimizar este impacto adoptando medidas de inclusão. Os pais ou a escola podem preparar uma fatia de bolo sem o alergénio para a criança poder comer quando existem festas de outras crianças. Na festa de aniversário da criança, a maioria dos alimentos devem ser feitos tendo em conta a alergia alimentar.  

Um diagnóstico correcto deve ser feito o mais cedo possível para minimizar o impacto na vida da criança, excluir falsas alergias e permitir um adequado desenvolvimento físico, psíquico e social, para um crescimento saudável e feliz.