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Introdução Precoce de Alimentos - Promover a Tolerância Imunológica

 

Dra Isis Sacramento Monteiro

Pediatra

Unidade de Alergologia Pediátrica – Unidade Local de Saúde de Santa Maria

A investigação científica aponta para a existência de um período crítico no início da infância, durante o qual o lactente atópico com predisposição genética para doença alérgica apresenta maior risco de desenvolver sensibilização. Assim, os efeitos das intervenções dietéticas nos primeiros anos de vida na prevalência de doenças alérgicas (incluindo a alergia alimentar) têm sido objeto de estudo.

Tanto na Europa como nos Estados Unidos, os principais grupos de estudo e comités de especialistas em alergia pediátrica recomendam a introdução dos alimentos sólidos entre os 4 e os 6 meses de vida em todos os lactentes. De acordo com as orientações de outros organismos científicos, a diversificação alimentar pode ser iniciada com segurança no mesmo período, embora muitos recomendem o aleitamento materno exclusivo nos primeiros 6 meses. Com efeito, o leite humano é o alimento ideal para todos os lactentes de termo durante os primeiros 4 a 6 meses de vida, independentemente do risco de doença alérgica.

Qualquer alimento é uma fonte potencialmente alergizante. No entanto, certos alimentos associam-se com maior frequência a reações alérgicas. Os alergénios alimentares mais comuns são o leite de vaca, ovo, soja, trigo, amendoim, nozes, marisco e peixe.

Quando se deve introduzir os alimentos com maior potencial alergénico na dieta? Ao longo dos anos, as recomendações têm vindo a modificar-se, particularmente no que respeita aos lactentes com risco elevado de doença alérgica. As guidelines anteriores recomendavam a introdução tardia dos alimentos sólidos de maior potencial alergénico em lactentes de alto risco, com o intuito de prevenir o aparecimento de alergia. Contudo, a evidência mais recente sugere que essa prática pode efetivamente aumentar (ao invés de diminuir) a incidência de alergias alimentares.

O estudo LEAP (Learning Early about Peanut Allergy) foi o primeiro ensaio aleatorizado a demonstrar o benefício da introdução precoce do amendoim, um importante alergénio alimentar. No estudo PETIT (Prevention of Egg Allergy with Tiny Amount Intake), a introdução gradual do ovo associada ao controlo estrito da dermatite atópica teve um impacto favorável na prevenção da alergia ao ovo em lactentes de alto risco. Outros ensaios clínicos com introdução do ovo aos 4 a 6 meses de idade em lactentes com risco de alergia alimentar – BEAT (Beating Egg Allergy Trial) e STEP (Starting Time of Egg Protein) – concluíram, respetivamente, que a introdução precoce do ovo inteiro reduziu a sensibilização e induziu níveis de IgG4 específica para a clara do ovo aos 12 meses de idade, não se tendo verificado aumento do número de reações alérgicas comparativamente ao grupo placebo.

Relativamente à introdução de alimentos sólidos na população de baixo risco de doença alérgica, a maioria dos estudos, nomeadamente estudos de coorte prospectivos de base populacional, não demonstram benefício no atraso da introdução de alimentos sólidos além dos 4 a 6 meses de vida. Aliás, à semelhança do que acontece na população de alto risco, a introdução tardia de alimentos sólidos pode aumentar o risco de alergia; o mesmo se verifica com a restrição da diversidade de alimentos introduzidos no primeiro ano de vida. Em contrapartida, a introdução precoce pode diminuir o risco de alergia. Desta forma, os alimentos complementares podem ser introduzidos na dieta de crianças de baixo risco a partir dos 4 a 6 meses, incluindo os alimentos mais potencialmente alergizantes. Não obstante, há que sempre ter em conta que algumas destas crianças consideradas de baixo risco podem na mesma apresentar reações alérgicas com a introdução de alimentos, uma vez que algumas poderão já ser alérgicas ao alimento à data da sua introdução (como se verifica, em algumas situações, com o ovo).

Face à crescente evidência dos benefícios, é lícito recomendar a introdução precoce de alimentos sólidos potencialmente alergizantes em lactentes de alto risco, a partir dos 4-6 meses de vida, desde que estejam preparados do ponto de vista do desenvolvimento psicomotor para a ingestão do alimento em causa, e uma vez demonstrada a tolerância para alimentos complementares menos alergizantes como cereais de arroz, frutas ou vegetais. A introdução pode ser realizada sem recurso a testes diagnósticos prévios, de forma gradual e cautelosa, em lactentes assintomáticos de alto risco. Em lactentes/crianças com antecedentes de reação alérgica imediata a um alimento ou ao leite materno, ou com dermatite atópica moderada a grave de difícil controlo apesar de tratamento otimizado, aconselha-se realizar uma avaliação alergológica (i.e. uma história clínica detalhada e eventuais exames complementares de diagnóstico) antes da introdução precoce de alimentos com maior potencial alergénico.

Nas crianças de baixo risco, os alimentos podem ser introduzidos na dieta em qualquer altura após os 4-6 meses de idade, incluindo os potencialmente alergizantes. Não esquecer que, atendendo ao grupo etário, todos os alimentos sólidos devem ser introduzidos de forma a não constituírem risco de asfixia.

Fora desta abordagem está o leite de vaca inteiro em natureza, que deve ser evitado até aos 12 meses de idade por razões não relacionadas com o seu potencial alergénico. As fórmulas para lactentes à base de leite de vaca, bem como outros produtos contendo leite na sua composição (produtos de panificação, iogurte, queijo), podem ser consumidos antes dos 12 meses.